domingo, 14 de outubro de 2012

Escolhas

Era uma noite de lua cheia, no qual as estrelas eram ofuscadas pelo brilho daquele globo prateado bem no meio do céu. O clima era ameno, o barulho quase inexistente. Talvez só não totalmente mudo, pelo calmo e baixo respirar de um bebê que dormia despreocupado em seu berço, sob os olhos de um pai que com um leve sorriso o analisava de cima a baixo, como quem não consegue acreditar no que está vendo, um sentimento de amor profundo em seu peito. Amor este como só existe entre família.
O jovem rapaz, com seus trinta e poucos anos, mal conseguia acreditar que aquela pequena criatura que descansava silenciosamente, e que há dez minutos atrás postava-se a chorar descontroladamente, havia saído como um fruto de seu amor por sua esposa. Como era incrível.
Deixou-se levar pelos seus pensamentos, não havia como não observar o pequeno garoto sem pensar em seu longo futuro. Estava animado por ter de ensinar ao seu bebê os primeiros passos, a falar "mama", "papa", a ter que ajudá-lo a se levantar de seus muitos tombos nas brincadeiras que faria. Seu coração acelerava só de imaginar.
De repente sentiu um frio em seu peito. Ao dar seus primeiros passos, seu filhinho estaria rumando para a independência, para o futuro, para o crescimento... Ah, mas ainda teria muito tempo com ele. A escolinha, os primeiros romances, teria que ensiná-lo a praticar esportes, quem sabe não seria um grande corredor como o pai?
A cena veio a sua mente, ele quinze anos mais velho correndo lado a lado com o jovenzinho. Talvez até perdendo para ele. Riu sozinho no quarto, cuidando para não fazer barulhos demasiados que pudessem acordar o bebê, ou mesmo sua esposa que repousava depois de dias cansativos de recuperação.
Ao mesmo passo que abriu seu sorriso, o fechou. Lembrou de quando era mais novo, de como não gostava que sonhassem futuros para si, de como queria construir seus próprios hobbies, seus próprios interesses, de como era rebelde em sua adolescência. Isso tudo se repetiria com seu filho? Provavelmente.
Crianças são seres humanos como quaisquer outros, indivíduos, pessoas com suas próprias necessidades. Imaginou seu filho acreditando que tudo era possível, crescendo querendo ser um astronauta, um piloto, pensando que pode fazer o que quiser. Na realidade, poderia mesmo. Tentou visualizar ele apaixonando-se pela primeira vez, dando seu primeiro beijo, seu primeiro relacionamento. Ah, como haviam coisas para se fazer e aprender nessa vida.
Em seguida viria a faculdade, a fase de aproveitar a vida e onde provavelmente pararia de acreditar no amor até se apaixonar de verdade. Onde teria o primeiro contato com a vida dos adultos, onde nem tudo é possível. Sentiu uma ponta de medo, não queria que seu filho passasse por isso.
E se o choque fosse tão grande que ele quisesse largar tudo e viajar como um andarilho, igual a estas histórias que ouve-se por aí? Como seria viver assim, à mercê da sociedade? Como viveria ele, o pai, sem saber notícias de seu filho, sem saber se estava bem, imaginando-o passando frio e fome. Talvez vivesse mais feliz do que essas pessoas aprisionadas no sistema, como chamavam. Talvez fosse mais feliz do que pudesse imaginar.
Seus olhos vislumbravam o nada enquanto filosofava. O engraçado é que preocupava-se tanto com alguém que alguns dias atrás nem sequer existia. Curioso como as coisas aconteciam na vida.
Olhou para seu relógio, já estava há um bom tempo ali. Abaixando-se cuidadosamente, postou-se a beijar a pequena testa do bebê. Ele nem acordou. Sorriu novamente, e finalmente encontrou a resposta das perguntas que estava se fazendo: não há como saber. Pessoas nascem sem medos, sem preconceitos, sem definições e sem parâmetros: tudo é possível na cabeça de alguém que acabou de nascer. Conforme se cresce é que absorvem-se experiências, que ouvem-se os primeiros nãos e criam-se os primeiros muros. Mas isso varia de ser para ser. Esperava o melhor para seu filho, mas sabia que para o seu bem era preciso deixá-lo experimentar, absorver, viver.
Respirando profundamente, deitou-se em sua cama pensando em sua vida e como estava feliz por tudo. Pelos momentos ruins e pelos bons como esse. Fechou seus olhos lentamente, deixando-se levar pelo peso do sono de um pai que pouco dorme em função de seu novo filho, mas que estava seguro de que acontecesse o que fosse acontecer, e estivesse onde pudesse estar, apoiaria seu filho incondicionalmente em suas escolhas conscientes.

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