sábado, 28 de abril de 2012

Cheek to Cheek


Era uma manhã chuvosa, típica de um outono que se perpetuava nos curtos dias de abril. Dentro de um pequeno apartamento, encontrava-se um jovem pensador deitado sob os cobertores e aproveitando as poucas horas de folga que teria neste frio sábado.
De repente uma música invadiu seus ouvidos, uma melodia diferente daquelas as quais estava acostumado a ouvir nos últimos tempos. Procurou de onde vinha aquele som, até encontrar sua origem na tela de sua televisão. Tratava-se de um comercial qualquer, mas de muito bom gosto. Fechou seus olhos e pôs-se a ouvir "Heaven, I'm in heaven...". Um clássico.
Este rapaz adorava clássicos como este, que remontavam a cenas de filmes antigos (os quais também era muito fã). Conseguia se ver em um caro restaurante na antiga New York, New York de Frank Sinatra, jantando com uma linda jovem em um encontro à moda antiga. Engraçado como sua imaginação era fértil e rápida.
Mais rápida ainda, foi a lembrança que veio com esta outra melodia.
Manhãs, tardes, noites e madrugadas de anos anteriores nos quais sua única preocupação era sonhar e lutar por seus objetivos. Lá de volta em sua cidade do interior, localizada em um longínquo vale no meio dos campos de um nada. Quando ir caminhando 5km até sua escola era uma atividade prazerosa. Quando se tinha pouco, mas o que era preciso. Quando pensava estar ousando demais em querer ir longe.
Já naquele tempo imaginava-se em um lugar totalmente distante, queria conquistar o mundo, e sabia por onde começar, motivo este que o fez criar foco e se esforçar para chegar ao seu ápice.
Ah, como se sentia bem ao fantasiar sua trilha sonora ao som dos melhores clássicos do Mestre Sinatra. Seu corpo encontrava-se no meio do nada, mas sua mente voava pelos arranha-céus americanos, as montanhas de Alberta, as paisagens canadenses.
O tempo voou e sua ansiedade crescia proporcionalmente. Já nem esperava mais, quando em uma noite na qual estava com um de seus melhores amigos, resolveu abrir seu e-mail e viu o título de uma nova correspondência que lá encontrava-se. "Admission Letter" era o título. Paralisou. Tudo o que conseguia explicar para seu amigo que o questionava do motivo de estar com os olhos arregalados era "Cara... Cara..."
Era indescritível a sensação que passava por seu corpo ao ler "We are pleased to announce that you've been accepted...". De repente seus sonhos tornavam-se realidade. Uma euforia subiu da ponta de seus pés, passando pelas suas pernas, seu tronco, seus braços, até arrepiar o último fio de cabelo. Não conseguia se segurar. O garoto acordou meio mundo, às duas da manhã, para avisar. Ele havia sido aceito na universidade americana! Superação era o nome do que sentia naquele instante.
Não bastasse isso, o mesmo sentimento, a mesma alegria, a mesma euforia ao ler as mesmas palavras de outro e-mail algum tempo depois. Ele havia sido aceito na universidade canadense.
Agora conseguia entender todos aqueles filmes hollywoodianos. Conseguia se colocar no lugar deles, se sentia honrado da oportunidade. Saiu no jornal da região, seu peito enchia-se de orgulho.
Mas seu coração também pesava ao ouvir o apelo de sua avó: "Não vá, meu filho. Vou sentir muita falta de você. É muito longe". Claro, as viagens para casa teriam que ser reduzidas para no máximo duas vezes por ano. Talvez passaria anos sem ver sua família de novo. Coisas nas quais não havia pensado antes, devido ao  tamanho de sua conquista, mas que agora faziam toda a diferença.
Por fim, haviam assuntos a serem tratados. Havia passado em uma universidade na capital de seu estado, e prometeu conhecê-la. Ledo engano ao achar que não se deixaria levar. Ao conhecer a cidade, apaixonou-se. Seu futuro estava comprometido, muita coisa para a cabeça de um adolescente que ainda morava com seus pais. Mas a decisão havia sido tomada sozinha em seu peito.
De volta à tarde de outono, sob seus cobertores, em seu apartamento na capital de seu estado e sem jamais ter saído de seu país, lembrava daqueles momentos inspiradores de seu longínquo passado. Às vezes nem parecia ser ele, era como se visse outra pessoa em uma tela de cinema.
"Heaven, I'm in heaven..." cantarolava enquanto lembrava. Havia pouco tempo que tomara a decisão de conhecer o mundo. Estava com quatro viagens programadas. Aproximadamente cinco anos depois daqueles episódios havia decidido pensar fora da caixa novamente.
O que teria acontecido se ele tivesse ido para a América do Norte já naquela época? Quantas coisas teriam sido evitadas? Quantas teriam sido perdidas? Momentos, desafios, relacionamentos, pessoas... E se ele tivesse tomado rumos diferentes? E se... Isso jamais saberia.
Enquanto olhava pela internet as fotos dos locais onde poderia ter morado, e pensava sobre suas opções, só tinha uma coisa que ecoava fundo em sua mente. O mundo é muito grande para se prender a pequenos espaços e lugares. Pra se prender a passados, e frases que comecem com "E se...". A vida é muito curta para indecisões. Ainda bem que, finalmente, a fantasia estava prestes a se tornar realidade.

domingo, 15 de abril de 2012

Quando você já escreveu tudo o que tinha para escrever, mas suas inquietações continuam reverberando de uma maneira profunda em sua cabeça.

quinta-feira, 12 de abril de 2012

The Beautiful Mess


 Quisera eu que decisões fossem fáceis de ser tomadas. Que eu não complicasse tanto as coisas. Que tudo fosse exatamente como quando éramos crianças: qualquer coisa é possível e tudo é simples.
Talvez isso possa acontecer, mas novamente eu falho na hora de tentar ser simples e complicar minhas decisões. Não sei.
O que acontece, é que me encontro em uma fase de decisões novamente. Há sempre essa bifurcação em frente, direita ou esquerda? Não há como voltar atrás, pois a cada passo que vamos dando em direção a uma ponte que representa nossa escolha, esta vai de desfazendo. Ficar parado também não é permissível.
Ao mesmo tempo em que nos vemos pressionados a tomar uma decisão, sofremos influências de todos os cantos. Sempre alguém com uma opinião, sempre uma crítica, sempre algo que nos faça repensar atitudes, pensar duas vezes antes de seguir este ou aquele caminho...
É como aquela boa e antiga música “What a beautiful mess”. Que linda bagunça é isso tudo. Tomamos estas decisões baseados em medidas de risco, prevendo o futuro que poderemos atingir, o que vamos ganhar, o que perderemos. A realidade é que jamais saberemos, até que realmente estejamos vivenciando os caminhos escolhidos.
E não é incrível de se pensar, que todos os caminhos que você tomou até agora, todas as decisões que fez te levaram para exatamente este momento, tornaram-se partes de seu caráter, de sua personalidade, te fizeram quem você é hoje?
Então a pergunta, talvez, não fosse aonde quero chegar. O correto poderia ser: Quem eu quero me tornar? Que tipo de pessoa serei amanhã? Sabendo que faço parte da sociedade em que vivo, como vou acabar influenciando o futuro dela?
Perceberam como complica-se algo simples?
Cada ser humano tem episódios decisivos em sua vida. Talvez você esteja tendo o seu, talvez ainda não teve nenhum, talvez o seu chegue amanhã, depois... Quem sabe?
Eu já tive vários, ou superestimei alguns. Acontece que aqui estou de novo nessa encruzilhada. Que caminho escolher? Que pessoa quero me tornar? Que bem eu poderei fazer? E repetindo estas perguntas é que eu vou enraizando e me prendendo em correntes imaginárias, estas que chamamos de “sistema”.
Não quero ficar atrelado a elas. Quero ser livre. Mas existe a liberdade? Eu só parei nesse ponto, antes de tomar a decisão, porque alguma coisa me fez repensar. Eu sei exatamente o que foi. Essa provocação da vida, esse céu azul que observo de dentro de quatro paredes, essa brisa balançando as árvores e fazendo-as emitir um som do qual não consigo ouvir, diferente do telefone que toca interminavelmente em minha mesa...
O que fazer?
Direita ou esquerda? Direita ou esquerda?
Tantas coisas pesando em uma, tão poucas pesando em outra, mas ao mesmo tempo dolorosa. Ir correndo ou contando os passos?
Em que grande bagunça vivemos. Por um momento vou tentar ser uma criança novamente. O jeito é vendar os olhos e seguir por um dos caminhos, sem olhar. Simples. Possível. O resultado, só o tempo...

sexta-feira, 6 de abril de 2012

Ser feliz

             Não sei se alguém já parou para pensar no mundo em que vivemos e o modo como nossa sociedade foi construída, da maneira como eu venho pensando...
                Nos últimos anos o Brasil vem se vangloriando de conquistas econômicas fenomenais, de milhares de pessoas saindo da pobreza, da classe média comprando mais, a economia girando, pessoas tendo mais patrimônio e empresários vendendo e faturando mais.
                Pois bem, com esse crescimento econômico veio o aumento da qualidade de vida, do poder de compra, da felicidade (?). É o que dizem. Mas o que não dizem é que o mercado regula-se de uma maneira muito estranha. Sobem os salários, sobe o poder de compra, mas sobe mais ainda o custo de vida. Conhecem, não é?
                Lembra quando você pagava um real pelo kinder ovo? Quando um salgadinho era cinquenta centavos? É, o aumento dele foi causado pela famosa “inflação”, pelo reajuste dos preços, repasse ao consumidor.
Com a maior demanda, encontra-se uma desculpa para aumentarem os preços. É a tal da mão invisível de Smith, não é mesmo? O mercado se auto-regula. Então dou um prêmio pra quem me mostrar em que página o meu amigo Adam diz isso em seu livro. E eu já li, acreditem.
Muito se fala na alegria que é ser brasileiro ultimamente, em como superamos todas as barreiras econômicas, no que não conseguíamos comprar antes e agora conseguimos. O que se esquecem, é que a felicidade não pode ser medida pela quantidade de coisa que compramos, isso se chama status, e é o que mais degrada a sociedade. É ele que faz a pessoa que não tem condições de comprar algo ter vontade de roubá-lo. É o status que faz uma pessoa se sentir inferior a outra por não ter dinheiro suficiente para comprar isso ou aquilo, por não ter uma casa como a da outra, um carro como o do outro.
Reclamam dos Estados Unidos, por ser o símbolo do capitalismo. Pelo menos a distribuição de renda é mais justa lá. Mas ainda não justifica. Pagamos impostos, batendo recordes todos os anos, sendo que só uma parte dele é corretamente aplicada. Isso é dinheiro que sai do seu bolso, um dinheiro que você trabalhou para simplesmente dar para alguém, para ver o prefeito da sua cidade andando com um Mégane comprado com ele, pra ver o seu governador dirigindo uma Tucson comprada pelo estado. E aqueles que mal tem dinheiro para comprar um Fusca? E quem mal tem dinheiro para comprar comida para seus filhos?
Fala-se da euforia de se ter uma casa hoje em dia. Como é bom, não é? Mais brasileiros morando bem... UMA OVA! Compare o tamanho dos apartamentos construídos há 10 anos atrás, com os apartamentos construídos hoje. Há 5 anos uma amiga comprou um apartamento de mais de 130m² por cento e quarenta mil reais. Hoje um de 65m² no mesmo bairro passa dos quatrocentos mil.
Cade a melhoria? “Ah, mas hoje o brasileiro ganha mais! Está mais fácil adquirir um apartamento mais caro.”. Sim, com certeza. O cidadão sai do aluguel, feliz por comprar um apartamento próprio. Finalmente sua própria casa. Que ele vai pagar em 60 anos. Tem noção do que é isso? Sessenta anos para pagar por um cubículo? Você tem preconceito por aquelas casas de Cohabs? O que difere uma daquelas, que tem 40m² construídos e um terreno maior para se aproveitar a vida, do que um prédio com 8 apartamentos de 65m² em doze andares? O status, talvez?
Posso estar reclamando de barriga cheia. O local onde trabalho tem benefícios que poucas outras empresas oferecem. Mas mesmo assim. Dôo 8h do meu dia, 40h da minha semana, depois vou para a faculdade onde passo mais 4h diárias estudando para poder receber mais, ou ter a sorte da minha empresa dar certo e ganhar mais.  Já são 12 horas que gasto para “ter uma vida melhor”. Tudo bem. Adicione a isso 1h a mais para ir ao trabalho, 1h a mais para voltar do trabalho, 1h a mais que tenho de intervalo de almoço (o qual não posso sair de perto da empresa porque senão perco a hora), 30m de deslocamento da faculdade, 6h de sono (que é o máximo que consigo durante a semana) e mais o tempo que preciso pra me alimentar e me arrumar para ir à empresa. Onde está o objetivo disso tudo?
Onde entram as artes? O conhecimento a respeito do mundo? O tempo que posso utilizar para conhecer novas pessoas? Sair a noite? Tudo bem, desde que você aguente o tranco no dia seguinte e não prejudique seu trabalho...
Já gastei dinheiro com coisas caras, no impulso de um novo status social. É muito bom andar de roupa de marca, gastar dinheiro com bebidas, comer bem, conseguir pedir coisas pelo telefone quando quisermos. Mas realmente precisamos disso tudo?
O culpado disso tudo não é o nosso governo. Somos nós mesmos. As pessoas fazem um governo, elas escolhem quem vai trabalhar nele, elas são donas das empresas, elas se submetem a trabalhar nas condições impostas por estas mesmas, elas pagam os valores reajustados, elas concordam passivamente com tudo.
Tenho familiares que moram quase isolados do mundo, em uma casinha no interior, onde produzem alimentos para vender a grandes empresas, a serem processados e vendidos em seu supermercado. Estes meus familiares produzem o que comem. Jamais tive uma refeição mais farta e gostosa do que aquele domingo em que almocei na casa de uma tia minha. Eles trabalham bastante, um trabalho braçal, mas sabem o valor das coisas. Trabalham para si, e são MUITO mais felizes do que muita gente que eu conheço, até mais do que eu. Garanto que não sentem-se traídos todo quinto dia útil do mês quando olham um contracheque. Fome não passam, frio também não e terra não lhes falta.
Passamos por muitas transformações nos últimos anos: crescimento econômico, urbanização, aumento do poder de compra, pessoas saindo da miséria... Ser feliz, para mim, é não passar fome, é ter simplesmente a presença de meus amigos por perto, minha família. É poder desfrutar da beleza da Terra, do modo como Deus a criou: sem dono. Não estou sendo comunista, apenas um sonhador. Este é o meu ideal de felicidade, mas e você? O que você considera ser feliz, já pensou nisso? Felicidade é ter coisas que as pessoas fazem, ou valorizar as pessoas que os fazem?